Rússia expande sua influência na África

Os interesses e políticas da Rússia no continente africano têm evoluído ao longo dos anos. A atual participação da Rússia no continente busca quebrar o isolamento diplomático e a pressão econômica impostos pelo Ocidente, além de reafirmar sua própria relevância no cenário internacional como defensora do novo "mundo multipolar". 

A Rússia tem demonstrado interesse crescente em expandir sua presença na África, mas, diante das eleições que ocorrem na Rússia, as mudanças na liderança russa ou as influências políticas externas podem afetar o equilíbrio de poder na África. Mas qual é a influência e por que o foco da Rússia se voltou para a África?



A relação da Rússia com a África

A relação entre a Rússia e a África está enraizada em laços profundos da era soviética que Moscou forjou com o continente. A partir da metade da década de 1950, à medida que a África se transformava em outro campo de batalha importante da Guerra Fria, a União Soviética se envolveu ativamente no apoio a movimentos de independência durante um período de conflito colonial e ajudou governos que enfrentavam conflitos internos ou externos.

 O Kremlin forneceu armas e equipamentos para esses estados, ofereceu treinamento militar e criou "um legado de longo prazo de equipamentos militares soviéticos e cultura operacional em toda a África". Após a dissolução da União Soviética, a recém-criada Federação Russa encontrou-se em turbulência política e socioeconômica, sendo forçada a se desconectar do continente, o que significou a interrupção de seus generosos programas de assistência. As primeiras tentativas visíveis de Moscou de se aproximar do continente começaram em meados dos anos 2000, quando Vladimir Putin se tornou presidente. 

Putin visitou imediatamente a República da África do Sul, e o Kremlin intensificou seus esforços diplomáticos após a anexação da Crimeia em 2014. Quando a primeira rodada de sanções ocidentais foi imposta à Rússia, forçou Moscou a buscar ativamente novos parceiros geopolíticos e oportunidades comerciais. 

Em 2019, o presidente Putin sediou a primeira Cúpula Rússia-África no retiro de Sochi, no Mar Negro, com o objetivo de fortalecer a posição da Rússia como um parceiro estratégico confiável no continente e garantir acordos contratuais e laços militares com diferentes nações. Moscou também prometeu perdoar dívidas adicionais. 

Mas por que a Rússia faz esses esforços diplomáticos contínuos? Simplesmente para ganhar influência. Um bom exemplo disso é contar com o apoio de muitas nações africanas em votações importantes na ONU.


Influência e relações econômicas

Vamos analisar três cenários. Em 2014, a Assembleia Geral da ONU condenou a anexação da Crimeia pela Rússia; em 2018, uma resolução exigiu que Moscou desmilitarizasse o Mar Negro e o Mar de Azov; e, em 2022, uma resolução condenou a tentativa de anexação de quatro regiões ucranianas pela Rússia. 

Nos três casos, um número considerável de países africanos votou contra as resoluções propostas, outros se abstiveram e outros nem mesmo compareceram à votação. Esses países africanos contribuíram, direta ou indiretamente, para os esforços do Kremlin em desafiar os Estados Unidos e seus aliados em fóruns internacionais. 

Além de fortalecer os laços diplomáticos com os países africanos, o Kremlin também expandiu sua presença econômica no continente. Por exemplo, as receitas comerciais entre Rússia e países africanos quase dobraram, passando de US$ 9,9 bilhões em 2013 para US$ 17,7 bilhões em 2021. As exportações de cereais são de particular importância, uma vez que quase 30% do suprimento de cereais na África vêm da Rússia. 

A recente retirada da Rússia do acordo de grãos do Mar Negro, que permitia a exportação segura de cereais da Ucrânia para diferentes partes do mundo, aproximou o Kremlin da África. Agora, a África poderá se beneficiar de suas próprias exportações de cereais de Moscou, eliminando Kiev do mercado global e aumentando a dependência de uma série de países africanos. 

Moscou afirmou que fará "tudo o que puder" para proteger a África das consequências negativas da suspensão do acordo de cereais, afirmando que "nosso país é capaz de substituir os cereais ucranianos de forma comercial e gratuita".

Planos futuros e desafios estratégicos

Durante a Cúpula Rússia-África de 2023, Putin prometeu começar a enviar cereais gratuitos nos próximos meses para essas nações africanas (Burkina Faso, Zimbábue, Mali, Somália, Eritreia e República Centro-Africana). Se Putin for reeleito, espera-se apenas a continuação desse plano. 

A Rússia busca intensificar sua presença no continente africano. Em troca, espera que os países africanos a ajudem a quebrar o isolamento diplomático e a pressão econômica impostos pelo Ocidente, além de buscar oportunidades lucrativas nas indústrias extrativas, expandir sua cooperação nuclear com o continente e ampliar sua presença militar em áreas-chave. 

No aspecto militar, a Rússia pretende construir seis bases militares em pontos estratégicos, como no Mar Vermelho, no centro do continente e em outras áreas. Quanto à extração de recursos, a Rússia está presente em quase toda a África, embora seja difícil perceber sua presença, pois ela geralmente não lidera grandes projetos, mas está sempre presente como acionista ou subsidiária. 

A Rússia também aumentou sua presença militar no Mali, enviando 100 soldados para Burkina Faso, sendo o primeiro de 300 soldados que ajudarão a junta militar no combate aos terroristas. Em relação à energia, o líder do Burkina Faso, Ibrahim Traoré, solicitou o apoio do presidente Putin na criação de uma usina nuclear no Burkina Faso, o que, segundo ele, ajudaria a suprir as necessidades energéticas do país e de outros países vizinhos. 

As incursões da Rússia na África apresentam sérios dilemas estratégicos para o Ocidente. Para os Estados Unidos, permitir que a Rússia se expanda ainda mais afeta os Estados Unidos e seus interesses e de seus aliados. No entanto, atacá-la de frente pode resultar em retaliação e acabar alimentando a narrativa de Moscou, algo recentemente vivenciado pela França.

Conclusão

A Rússia está cada vez mais buscando expandir sua influência na África, não apenas por motivos econômicos, mas também por razões geopolíticas. Através de esforços diplomáticos, apoio militar e laços econômicos, a Rússia está construindo uma presença significativa no continente africano. 

Isso apresenta desafios estratégicos para o Ocidente, que precisa considerar como lidar com essa crescente influência russa sem desencadear uma reação adversa. Enquanto isso, a África está se tornando um campo de batalha em que diferentes potências competem por influência e recursos. 

A evolução das relações entre a Rússia e a África é um tema a ser acompanhado de perto nos próximos anos